Gabi



Segunda vez que publico esse conto em um dos meus blogs. É apenas um relato de uma mulher que às  vezes desperta em mim. É apenas um surto de autoestima baixa. É apenas eu se fosse mulher e diferente.




E hoje ao abrir os olhos, vi que o sol batia forte e brilhante na janela do meu apartamento de dois quartos no oitavo andar deste edifício de lajotas amarelas e vermelhas. Me emaranhei nos lençóis verdes e azuis que ganhei no inverno passado, o último presente que minha mãe me deu. Nessas manhãs de inverno ensolaradas só se quer deitar-se na cama e sentir o calor dos lençóis, que se une com o frio do mundo exterior e resulta no clima mais propício para o sono matutino. Com a cabeça embaixo do travesseiro lembrei das manhãs que pedia a minha mãe para dormir até mais tarde. Sorri,  e com meu hálito matinal, perdi-me em meus sonhos mais uma vez, e só acordei uma hora e meia depois. Me desenrolei e abri meus braços sobre a cama de casal. Fiquei encarando duramente as quinas do teto, caçando rachaduras e teias de aranha. O reboco perfeito só precisava de uma pintura, algumas rachaduras, algumas rachaduras e pequenas manchas, porém, a perfeição é imperfeita.
Meu corpo pálido ainda seduz os homens. Semana passada passei por um canteiro de obras há alguns quarteirões do meu prédio e os pedreiros assoviaram para mim. Sorri, boba. De vez em quando flagro algum cara olhando para meu seio redondo, dentro do bojo de meus sutiãs pretos, a esperar alguma boca furiosa, sonhos de mulher, desejos de adolescente.
Uma vez conheci um cara numa festa. Nos beijamos lá mesmo, e eu senti o gosto de vodca em sua língua. Perguntou se eu queria ir para algum lugar mais tranquilo, eu falei que não, falei que queria ir pra minha casa, com ele. Ele estava mais bêbado que eu, então decidimos que eu dirigiria, meu carro, depois ele pegava o dele... Trocamos sacanagens no carro, carícias e declarações mentirosas. E eu incrivelmente gostei daquilo, daquela vulgaridade, sei lá, algo me encantava, talvez por sair totalmente dos meus padrões sentimentais. Terminamos aquela noite manchando os lençóis de minha cama. Ele com seu esperma, e eu com meu batom. E na manhã seguinte o filho da puta saiu de fininho, deixou um bilhete mais filho da puta que ele em cima de meu criado-mudo. “Tenho que ir trabalhar, te ligo, beijo.”. Filho da puta... Filho da puta! Burro! Como ele ia ligar se nem ao menos dei meu número a ele?
Estiquei meus músculos e fui até a varanda. Calcinha e sutiã. Peito no parapeito e pensamento se suicidando, pulando do alto do oitavo andar.Já sonhei com os invernos de Paris, na verdade foi com todas as estações, sonhei com Paris. Sonhei em amar em Paris. Aquela melancolia vagarosa das luminárias, das ruas, das neblinas tímidas e da nostalgia involuntária das esquinas da cidade luz. Sete dias em Paris, mil e duzentos, não lembro se eram dólares ou reais, mas uma vez procurei na internet, até tentei juntar dinheiro, mas Paris é muito longe e a vida é muito curta.
Sempre ouço nos filmes, ouço as pessoas falarem ou leio nos livros que do oitavo andar as pessoas lá embaixo, na calçada, parecem formigas. Mentira, elas só ficam pequenas, não parecem formigas. Elas fumam, caminham para os seus empregos, se suicidam, choram por um amor acabado e morrem atropeladas, quando não olham para os dois lados antes de atravessar a rua. Do outro lado da rua acabou de ser construído um prédio residencial e alguns moradores se mudaram hoje. Talvez, em alguma dessas janelas espelhadas haja um homem me vendo, somente de calcinha e sutiã. Talvez ele esteja se masturbando, imaginando-se nas rendas de meu sutiã. Meu corpo pálido ainda seduz os homens.

2 comentários:

Liliane disse...

Texto Lindo Parabéns !

estou a te seguir!

http://alguemparaconversa.blogspot.com.br

Mariana das Neves disse...

A Gabi realmente atrai e é de uma personalidade singular. Gostei bastante do texto.

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